domingo, 7 de fevereiro de 2010

A MAGIA DA ÓPERA DE PUCCINI



Rui Martins (*)

Berna (Suiça) - Se nas suas andanças pela Europa passar pela Suíça, veja se a ópera La Bohème de Giacomo Puccini está programada, em Berna. Se estiver, vale a pena uma esticada até a cidade medieval de Berna, por sinal capital da ilha helvética alpina, no meio da União Europeia.

A composição de La Bohème se baseou num livro de sucesso na França, Cenas da Vida Boêmia, de Henri Murger, publicado em seriado numa das revistas parisienses da época e depois reunido num livro, inspirador de uma peça de teatro. Outro compositor também se inspirou no mesmo tema, Rugero Leoncavallo, mas sua composição chegou ao palco com um ano de atraso e nunca obteve o mesmo sucesso.

Ao contrário do que podem pensar os expectadores ou ouvintes da ópera, seu título não se refere apenas a Mimi, personagem boêmia, mas à vida boêmia ou ao comportamento boêmio de todos os personagens, expressão que no nosso idioma mereceu uma pronúncia livre sem o acento circunflexo, imortalizada numa canção popular de Adelino Moreira, por Nelson Gonçalves, na sua volta à boemia.

Naquela época, a boemia só podia mesmo existir em Paris e seus personagens são artistas, quase enregelados, no primeiro ato, com o frio invernal parisiense,a ponto de queimarem as páginas de um romance manuscrito para poderem esquentar um pouco o sótão, onde vivem.

A música de Giacomo Puccini é a razão do sucesso contínuo há mais de cem anos, dessa ópera. E quando o poeta,a pretexto de procurar uma chave caída no seu quarto, no momento de acender a vela ou lamparina da vizinha, começa a cantar « que mãozinha gelada, deixe-me esquentá-la...sou um poeta, escrevo... e na minha alegre pobreza, disperso, como um grande senhor, rimas e hinos de amor », é impossível deixar-se de sentir a música que provoca aquele estado de alma de bemaventurança.

Quando cobria para o Segundo Caderno do Estadão, o Festival de Cinema de Berlim, começo de fevereiro, invernão europeu, tomava o trem noturno, que partia à meia-noite de Basiléia para chegar a Berlim, em frente ao cinema Zoo-Palast, por volta das sete da manhã. Deitado num dos quatro leitos do compartimento do vagão dormitório, lembro-me ainda de quando levei comigo um walkman e ouvia La Bohème até chegar o sono. Eram cantos de beleza extrema, num quadro triste, cujos acordes podem se imortalizar na memória.

Foi talvez essa beleza que levou a televisão suíçoalemã, a transmitir ao vivo La Bohème, diretamente de um prédio de um dos bairros de Berna, num cenário atual do que seria a vida de boêmios com seus artistas e Mimi, a personagem principal, e Musetta. E que garante o Stadt Theatre de Berna lotado em todas as apresentações.


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(*) Ex- correspondente do Estadão e da CBN, após exílio na França. Autor do livro “O Dinheiro Sujo da Corrupção”, criou os Brasileirinhos Apátridas e propõe o Estado dos Emigrantes. Vive na Suíça, colabora com os jornais portugueses Público e Expresso, é colunista do site Direto da Redação.

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Assista ao Ato II, Café Momus, da ópera La Bohème (legendado)

http://www.youtube.com/watch?v=Q8smNuqAZEg&feature=related

Ilustração: AIPC – Atrocious International Piracy of Cartonns

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PressAA

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